Desde a minha primeira corrida, não há muitos anos, que recordo
bem de que forma atravessei pela primeira vez a meta após 10 quilómetros.
Na altura, corria há poucos meses, e os ritmos, … bem esses
eram devagar, devagarinho. Como tudo na vida, tudo tem um início. E foi aí que
se iniciou este bichinho pela corrida.
Aos poucos, e naturalmente fui evoluindo, a coisa foi
melhorando e os minutos a baixar, até chegar a um patamar em que os tempos
finais rondavam os 41/42 minutos. Foi aí que me desafiei a conseguir correr uma
prova abaixo dos 40 minutos. Sabia que naquela altura ia exigir muito de mim,
sendo uma fase inicial. Mas não tinha como uma data limite para o fazer, iria
esforçar-me para tal, mas sem pressas.
Contratempos, e a participação em cada vez mais provas
longas, e de trail, colocaram este objectivo um pouco de parte. Sabia que
eventualmente iria voltar às distâncias curtas, e que aí iria tentar novamente
a proeza.
As “São Silvestres” são uma delícia para se conseguir esse
feito. O convívio, e a forte presença de apoiantes pelas ruas ajudam, e era a
minha oportunidade de terminar o ano em beleza.
Escolhi a de Ovar, na fresca noite de Dezembro para tentar a
minha sorte.
Pelo que havia feito nos últimos treinos estava confiante
para ser finalmente um “sub 40”, mas naquela noite de Sábado não me sentia
capaz de o fazer, não sabia o quê, nem o porquê, mas estava reticente, e não
quis elevar a fasquia. Optei por apontar para o tempo final de 40 minutos. Já
seria bom, pelo menos retirava 1 minuto ao meu recorde pessoal.
Lá no fundo tinha uma pequena esperança que tudo ia correr
bem, e que ia conseguir um brilharete, e segui à risca a estratégia que já
tinha delineado. Aquecimento q.b., e tentar posicionar-me o mais à frente na
linha de partida.
O aquecimento foi mais que bom, estava quente o suficiente
para poder arrancar. E a faltar ainda 10/15 minutos para o arranque, deparo-me
com uma quantidade enorme de atletas já inseridos bem atrás do pórtico. Tento
“furar” o máximo que consigo, até não conseguir mais, e vejo a coisa a andar
para trás.
Aguardo pela contagem enquanto arrefeço e vou trocando
palavras com pessoal.
Aproximava-se a hora, e finalmente podemos chegar à frente
após entrada do pessoal de elite. Estava relativamente mais perto do pórtico,
mas a confusão era tanta, que parecíamos sardinhas enlatadas.
Foto Organização |
À hora arrancamos, e o que suspeitava confirmou-se. Grande
parte dos atletas que ali estavam à minha frente são daquele tipo de atletas
que mais me enerva em provas. Colocam-se na frente apenas para atrasar quem
quer tentar alguma coisa. Não que fosse o meu caso, mas tentava retirar pelo
menos um minuto ao meu melhor tempo. Enfim.
Queria tentar manter um ritmo entre os 4.10, 4 min/KM
durante o primeiro quilómetro. E só com alguma destreza o consegui. Eram ritmos
inconstantes, um para e arranca infernal, e muita confusão. Tentava fugir ao
máximo daquela confusão, mas com o passar dos primeiros 1000 metros, o relógio
apontava um ritmo médio de 4 min/KM.
Nem tudo era mau, pensei, agora seria manter e
consequentemente aumentar.
Uma das funções que gosto de utilizar no meu relógio, é a
previsão de tempo final de uma determinada distância consoante o ritmo que vou.
Foi o meu apoio desde início.
Logo a princípio apontava para uns 42 minutos, o que achei
normal, dado a velocidade que até ali mantive. Não estava preocupado, pois
estava a sentir-me solto, e sem cansaço ou ofegante devido aos ritmos
inconstantes.
Algumas curvas e contracurvas até entrar numa recta onde a
estrada era mais larga, e se tomava sentido à dimensão de quantidade de atletas
que ali estavam. O ritmo havia melhorado, e já estava abaixo dos 4 minutos, o
que era fantástico, mas achei prematuro naquela fase.
Aproveitava a “boleia” de alguns que me ultrapassavam para
seguir atrás deles, até finalmente estar mais disperso da multidão.
Já levava cerca de 3 quilómetros quando já vinha a completar
um pequeno grupo de 4 elementos. Eramos 4 atletas, sendo uma feminina, todos
eles pareciam estar a fazer de lebre, e ela a tentar a sorte dela. Após me
sentir bem naquele ritmo mais forte que adoptei deles, fui avançando deixando
para trás um dos atletas, e colocando-se ao meu lado um outro, a rapariga
percebeu a ideia, e colocou-se mesmo logo atrás de nós.
Era a descer e aí todos os santos ajudam, tanto consegui
manter a velocidade, como fui aumentando e acabei por me afastar deles,
deixando-os para trás.
Era um percurso perfeito, sem nos apercebermos bem das
subidas, por ter um declive tão reduzido, e por conseguirmos “deslizar” nas
descidas.
Era altura de passagem pela zona da partida (e meta)
novamente, e aos poucos que nos vamos aproximando do centro de Ovar, o apoio
vai aumentando, cruzando com algumas pessoas aqui e ali.
Olhava para o relógio e já apontava para uns 39 minutos de
tempo final, com tendência a baixar mais. Estava a achar aquilo estranho, mas
estava com pernas, caixa, e força para mais. Pensei que tivesse abusado na
primeira parte, e iria sofrer dali para a frente, mas o meu corpo ia-me dizendo
o contrário.
Estava com 5 quilómetros, e ali estava o abastecimento de
água que evito sempre deixar para trás. Desta vez, ia ser diferente, via os
voluntários a estender o braço do meu lado esquerdo, e alguns atletas na
direcção deles. Afasto-me e mantenho o ritmo, dali para a frente seria eu e o
meu guia, vulgarmente conhecido como relógio.
Havia partes que coincidiam com a meia maratona de Ovar, que
já conhecia, e sabia se podia abusar, e nestes últimos 5 quilómetros, havia
alguns desses segmentos.
Contudo eram os quilómetros mais mórbidos da prova. Tanto
pelas ruas vazias, como pela escuridão tornando o percurso perigoso. Foram
vários os passos que dei sem perceber onde colocava o pé, tentava sempre seguir
quem ia à frente.
Consultava o relógio novamente e o tempo final, apontava
para uns 38 minutos e tal, pensei para comigo que isto iria ser melhor que um
brilharete, alguma coisa não estava bem, mas o que era certo é que os ritmos
estavam sempre certos desde o arranque, e tudo batia certo.
Sentia que ia ser aquele dia, sentia que iria ser ali que ia
finalmente ser um sub 40.
Já algum tempo que havia sido ultrapassado por um
conterrâneo, mas sempre se manteve a uns 20/30 metros à minha frente. Até ao
quilómetro 7, o meu objectivo foi evitar que ele fugisse de vista, agora era
tentar alcança-lo, para evitar perda de ritmo. Aumento o ritmo, e vejo a placa
do quilometro 8, ultrapasso numa ligeira subida, e entro em terreno plano.
Era altura de puxar pelas pernas, não que não o tivesse
feito até ali, mas dali para a frente seria um contrarrelógio.
O relógio continuava a apontar para os 38 minutos e alguns
segundos, queria tentar tirar o máximo possível, e apertei de maneira a
aguentar aqueles 2 últimos quilómetros, com o mesmo ritmo de princípio a fim.
As palmas já se iam ouvindo, os festejos e o speaker. Sentia-me
concretizado, a multidão em redor aplaudia, não para mim directamente, mas para
os muitos que ali passavam, mas fui egoísta, corria como se aqueles aplausos fossem
só para mim. Aproveitava também as descidas para acelerar mais um pouco. Era os
últimos 100 metros, e seria a subir até à meta. Subida quase sem declive de
início, mais acentuada no final, mas sem dar para esforçar os músculos. Aí
estava, o tão esperado sub 40. Tempo líquido de 37:55.
Infelizmente não posso afirmar ser o meu tempo final dos 10
quilómetros, por a prova ter uns 300 metros a menos. Fiquei um pouco triste,
mas sabia que aqueles 300 metros iriam ser feitos certamente sem problema
algum, colocando o meu tempo nos 38 minutos e alguns segundos.
A noite fria ajudou a que não quebrasse, e a corrente humana
que havia a apoiar junto à meta foram uma grande ajuda. Apenas um reparo para
validarem a certeza da distância final, nas zonas escuras, e no abastecimento,
que apesar de não o usar vi que tinha apenas uma pequena bancada, que não daria
para dispersar a maioria do pessoal quando começassem a chegar aos grupos.
São pequenos pormenores que podem facilmente serem
rectificados, e ter uma prova de excelência.
O que ficou mesmo na memória, foi um final de ano com
objectivo realizado. E um belo pão de ló de Ovar, que é uma delícia.
Tirada do Google. |
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