Euforia,
ansiedade, entusiasmo, uma criança no dia de natal. Este era eu no dia 5 de
novembro.
A
mítica distância de 42 quilómetros estava já na minha cabeça algum tempo. Desde
de Dezembro de 2016, quando aproveitei a habitual promoção para fazer a inscrição.
O grande passo estava dado, a partir daí seria habituar-me à ideia, e treinar
para isso. Ainda tive a oportunidade, prematura de fazer a mesma distância na
Lousada, mas não sei porquê parece que me ficou a faltar alguma coisa. E a
prova disso foi a passagem pela Maratona do Porto.
Após
a meia de Ovar, tive ainda tempo para fazer mais 2 treinos longos, e forçar um
pouco as pernas, e finalmente descansar para o dia “D”. Pouca ou quase nenhuma
preparação me iam impedir de deslocar para o Porto para correr, se não fizesse
a correr, caminhava, se não conseguisse em 4 horas, iria para mais. Não me
importava, apenas queria viver aquele ambiente que apesar de ainda não ter
experienciado, já tinha lido e visto vídeos que mostravam que seria uma
diversão.
Apesar
de pensar neste dia, apenas no dia 4 de novembro caí na realidade que já estava
quase. Com o rápido e fácil levantamento do dorsal e kit de participante,
aproveitei para dar uma visita pela feira que completava todo aquele evento,
apenas não usufrui da pasta party, por ter acabado de almoçar há relativamente
pouco tempo.
E
estava tudo pronto para o dia seguinte. Dia esse que chegou rapidamente, e que
não quis precipitar em nada, tendo já tudo mais ou menos orientado do dia
anterior.
Apesar
do arranque ainda cedo com o meu primo habitual de outras aventuras, e mais o
grupo que ele habitualmente corre, chegamos um pouco em cima da hora, tendo que
fazer uma breve corrida até à partida. E a confusão era imensa, mas felizmente
conseguimos chegar a tempo e horas, com poucos minutos de antecedência.
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Muito lá para trás |
Por
brincadeira ou não, para ir com algum objectivo, eu e o meu primo, colocamo-nos
entre as bandeiras das 3.30h e 3.45h, podendo deixar ser ultrapassados por
estes últimos, mas nunca pelas 4 horas. Resumindo, queríamos tentar chegar
antes das 4 horas.
Os
abastecimentos foram sempre obrigatórios e não deixei nenhum ao acaso. Os
ritmos até estavam a ser bastante bons, e conseguimos seguir sempre juntos.
Perto
do quilómetro 15, coloco à frente do meu primo para ser eu a puxar um pouco ao
ritmo que até ali impusemos. Estava espantado que as pernas estavam a responder
bem, e estavam a deixar seguir sem problemas. A ajuda externa e o apoio, foram
sempre constantes, e alimentavam bem qualquer um. Aos poucos reparei que o meu
primo ia abrandando e não conseguia manter o mesmo ritmo, assim também
abrandei, e fomos um pouco mais devagar, sem problemas. Chegado à Ribeira, uma
das zonas mais emblemáticas do Porto, e da Maratona, é um ponto viral nesta
distância.
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Rotunda da Anémona |
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Um pequeno exemplo das muitas gargalhadas que dei |
Atingido
os 21 quilómetros, e continuamos viagem para novo retorno, numa das fases mais
complicadas do trajecto, tendo em conta o piso. O asfalto que aqui existe tem
bastantes buracos, e irregularidades, e quando o asfalto não existe, é
substituído por paralelos, sendo estes bastante dolorosos para os pés, forçando
muitos atletas a desviarem-se para o passeio.
Contudo
fazia parte do caminho definido e teria que ser feito, de uma forma ou de
outra. Aos poucos vou verificando que a minha companhia começa a abrandar, e a
ficar para trás, chegando a sermos ultrapassados pelas 3.45h.
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Subida da Ribeira para a ponte Dº Luís |
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Dos momentos mais arrepiantes |
Por
diversas vezes apoiou-me e levou-me ao final sem que eu ficasse para trás por
qualquer que fosse o motivo. Desta vez, essa função seria a minha, e custe o
que custasse teríamos que atravessar a meta juntos, nem que fosse a caminhar.
Felizmente o meu cenário era completamente diferente não estando ainda com
mazelas, e ainda com boa resposta das pernas. Nova travessia pela ponte D.
Luís, com, novamente, uma animação incrível, e em direcção ao último retorno
que era feito já junto à ponte do Freixo.
Atingida
a marca dos 30 quilómetros, e os problemas musculares começam a vir ao de cima,
e a posição de desistir continua a ser o tema, mas com persistência sempre
afastei essa ideia da cabeça dele, e intercalando a caminhada e corrida lá
continuamos até à passagem pelo túnel, que tem um toque perfeito pela
organização.
Já
com sensivelmente 33 quilómetros, deixamos de novo a ponte D. Luís e a sua
multidão para trás, e entramos num curto túnel ao som do tema “Chariots of
Fire”, e ao ouvir isto arrepio-me com uma cena que me apercebo à minha frente.
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Fantástico! |
Poucos
metros um atleta me antecedia, com já algumas queixas e cansaço aparente, mas de
mão dada a uma criança, esta lhe dizia para ter força e continuar.
Concluindo
o túnel, nova estrada em paralelos, mas sem grandes hipóteses para fugir destes,
e descer até à estrada que já havíamos percorrido na vinda, levando-nos até à
meta pelo mesmo percurso inicial.
O
meu primo acabou por aceitar que não o deixaria para trás, e concordou em
terminar a prova, ainda com uma pequena paragem por um dos controlos médicos,
apenas para colocar o spray nas pernas de forma a aliviar um pouco a dor que
lhe incomodava algum tempo num dos gémeos.
Aguardei
por ele, e assim que voltou, tentamos impor um pouco de corrida para ver se a
dor teria aliviado, e felizmente conseguiu. Contudo o desgaste todo estava lá,
e teria que ser gerido até ao final. A presença de pessoal a dar apoio ainda
era continua, mesmo que mais escassa que inicialmente, mas já era normal tendo
em conta o tempo que andávamos ali. A bandeira das 4 horas já nos tinha
ultrapassado e não nos importamos muito com isso. Aliás ainda nos rimos com essa
situação, seria o tempo que fosse.
Como
já devem ter reparado, uma das chaves e grandes feitos desta maratona é a
presença de um grande aglomerado de apoiantes que nos incentivam a cada passo
que damos. Desde uma pessoa completamente estranha chamar por o nosso nome, por
causa do dorsal, e dar-te força, a pequenos momentos ou frases que nos dizem
que ficam gravados.
Já
na penúltima subida, tive mais um desses momentos.
Estava
a tentar com que o meu primo ganhasse animo e energia para fazer a subida que
com quase 40 quilómetros estava a ser dolorosa. Com algum esforço a foi fazendo
até parar e voltar a caminhar, quando olho para trás, e em conjunto com pessoal
de fora puxamos por ele. Uma das pessoas reparando nesta situação, aplaudiu-nos
dizendo “Grande companheirismo. Juntos até ao fim.”. E sim, foi esta a receita
para esta maratona. Não só por ele estar num dia não, mas também por ele já o
ter feito por mim.
O
mal dele, também acabou por ser o meu bem, ou assim o vejo. Penso que a minha
preparação não foi a ideal para esta prova, e provavelmente em algum momento
também iria quebrar, no caso de continuar ao ritmo que estávamos a tentar impor
inicialmente. Apesar das boas sensações que foi conseguindo ter ao longo de
toda a prova, e da boa resposta das pernas, havia uma grande probabilidade de também
eu empenar.
Voltando
à prova, e após esta subida temos a longa recta que nos leva até à rotunda do
Castelo do Queijo, ligando novamente à rotunda da Anémona que nos obriga a um
último esforço a subir até queimódromo do Porto. Aos poucos vamos ouvindo o
speaker, e sabemos que estamos perto do final, os últimos incentivos por quem
ainda ali anda, e o grande momento de atravessar a meta. A subida é feita como
se estivéssemos a iniciar a maratona, o sorriso ocupa a o seu lugar na cara e
com orgulho de tudo aquilo que fiz calco a passadeira vermelha que me leva até ao
último pórtico e à meta. Fantástico terminar desta forma uma distância que
merece respeito, e que tanto de nós exige. Ver o sorriso e as lágrimas, os
beijos e abraços, no fundo uma vitória pessoal para cada um. Sem dúvida fiquei
agarrado à prova.
Até
para o ano Maratona do Porto!
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