terça-feira, 31 de dezembro de 2019

São Silvestre do Porto - Uma imensidão


Gosto sempre daquele sabor das corridas de fim de ano. As São Silvestre, aquela designação que é usada em imensas provas por todo o país, e que pretendo todos os anos fazer uma diferente, apesar de não ter sido o caso, acabando por voltar à primeira em que participei já em 2016.
Tinha todas as condições para fazer em tudo, melhor prestação que há 3 anos atrás, não fosse a inexperiência da altura, e o recente empenho mais sério nos treinos.
Estava sem objectivo, sem foco, apenas divertir-me e tentar deixar algo de mim ali, pelo menos era esse o pensamento antes do tiro de partida, que acabou por desvanecer ainda uns 45 minutos antes da hora de arranque.
É uma imensidão, um aglomerado enorme de pessoas que se juntam aos já imensos turistas que percorrem as ruas do Porto, e o facto de estar mais atrás, ou mais à frente nesta prova é o suficiente para perder ou ganhares tempo ao quando estás na estrada.


Avenida dos Aliados. Foto da organização

Faltavam pouco menos de 1 hora quando abriram os pórticos de partida, e tentando colocar-me o mais na frente possível, obrigou-me a não ter aquecimento, e uma longa espera no meio de uma confusão de atletas que ali aguardavam como eu.
Uma vez ali dentro, com tempo de sobra, foi o primeiro indicio de que aquele palavreado de passear iria ser para esquecer, e a prova iria para ser feita com a faca nos dentes.
Faltava 2 a 3 minutos para a partida, e sentia um arrepio, estava um ambiente incrível, com tanta gente a correr, como a ver, fazendo um corredor enorme pelas ruas do Porto.
O que já não achei incrível, foi a forma como se sucedeu os primeiros quilómetros, o que já estava à espera dado a grande enchente, e o arranque em frio.

Tentei ali dispersar-me com mais rapidez que o normal, mas era impossível, parecia que estava numa prova de trail, com saltos e desvios repentinos, como se houvessem raízes ou pedras que atrapalhassem, apenas para tentar ultrapassar só mais alguém no meio de tantos.
Foram 3 quilómetros disto, onde tentava sair de uma zona carregada de pessoas, tentando aquecer, entre subidas e descidas.
Só ao 4º quilómetro é que consegui estabilizar num ritmo já próximo do normal, mas mesmo assim não dentro do que pretendia, as grandes e complicadas subidas já haviam ficado para trás, agora era tudo acerca de longas rectas, onde já sabia que teria hipóteses de recuperar algum tempo.
As ruas continuavam incríveis, havia sempre alguém, nunca nos sentíamos sozinhos, ou abandonados, e davam animo para não abrandar.


Foto da organização

A passagem pelo abastecimento, ditava o meio da partida, e para mim o tentar meter um ritmo mais forte, e fazer uma segunda parte mais rápida.
Pouco apreciava ou via em que ruas andava, apenas estava focado em manter um ritmo certo, e tentar com que a faca não saísse da boca. Se na primeira metade, foram essencialmente subidas, aqui eram essencialmente descidas e planos, e era nas descidas que tentava abusar, ainda que contido, e nos planos que tentava manter a velocidade. Assim que vejo o placar do 8º quilómetro, sabia que estava feito, agora seria uma questão de qual o tempo final, mas teria que ser abaixo dos 40 minutos, desse por onde desse.

Chegava ao túnel dos Almadas e restava pouco menos de 1 KM para o final, a descida fila mais abruptamente, e lá em baixo tentava manter um ritmo constante de forma a recuperar um pouco a caixa, para a subida que nos fazia sair dali.
Doeu, mas saí do túnel, faltava descer até aos Aliados, contornar e subir até à meta.
Este era o momento mais alto da prova, onde se preenchia um autentico corredor humano com uma presença incrível de apoiantes até à meta.
Essa, só vi assim que contornei os Aliados, e comecei a subir, mesmo no cimo da Avenida, com o relógio a contar 39 minutos e alguns segundos. Não percebi os segundos à primeira, e foi então que decidi dar tudo o que restava naquela subida e chegar antes dos 40 minutos oficiais, que o liquido já sabia que ia ser abaixo.


Saída do túnel. Foto da organização

É sem dúvida das provas mais incríveis que fiz, tanto pela moldura humana que tem, como por toda a envolvência de atletas e apoiantes, fazendo provavelmente a prova mais ou das mais repletas a nível nacional. O único senão, é o facto de ter imensa gente, que congestiona mesmo em vias com várias faixas.
Foram os últimos cartuchos de 2019, aguardemos por 2020.


Foto da organização

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Mamoa River Trail - Sabor agridoce


Quase de faca nos dentes, não literalmente, nem tão de perto o que se entende quando se cita uma expressão como esta. Basicamente queria deixar tudo de mim ali, dar o que conseguia, mesmo sabendo que apesar de ter capacidades para terminar, não tinha a velocidade que realmente queria. É a estreia de uma prova que percorre caminhos semelhantes ao Trail Medieval, mas que continha 1200 D+ em 25 KM. Tendo em conta que não é uma zona com serras de grande elevação, só conseguia imaginar um trajecto em forma de carrossel, com subidas e descidas repentinas, curtas e inclinadas.

A manhã era fresca, aliado ao facto de estarmos junto ao rio, o calor era completamente inexistente, e apenas uma breve corrida me fez ganhar algum calor para não arrancar frio, e abafar em pouco tempo.
Aproximava-se a hora, e uns 80 a 90 atletas colocavam-se atrás do pórtico aguardando o tiro de partida, para de seguida dar uma pequena volta pela praia fluvial de Mâmoa.
Não percebi bem o que queriam com aquela volta ali, provavelmente um pequeno aquecimento para o pessoal todo, uma forma de dispersar a malta, não sei…
Mas acredito que tenha sido esta última, por entrarmos logo num trilho um pouco mais apertado.
Trilho maiormente em terra e pedra cravada à superfície, fácil de correr e de rápida progressão, atravessa rio aqui e ali sob pedras e vou progredindo sem problemas.


Méééé - Créditos na foto

Os trilhos iam-se moldando, mas na sua grande maioria feitos por single tracks, o que adoro, diga-se de passagem, mas que dificultam por vezes a progressão por serem irregulares, ou alguém ir mais lento e não haver chance para passagens sem por em perigo alguém.
No entanto não era o meu caso, ia bem disperso, e chegado à primeira subida ia na frente de um pequeno grupo de 3 atletas, sendo perseguidos uns metros atrás por um outro de 4 ou 5 elementos.
Foram aproximadamente 200 D+ em pouco mais que 2 KM, existindo por vezes 30% de inclinação, que obrigava a uma maior amplitude de movimentos.
Uma vez no cimo, a descida não tardava, e estava a comprovar-se a minha teoria, subidas e descidas rápidas e curtas.

Descida até ao primeiro abastecimento, com pouco mais de 5 KM, achei demasiado cedo, e apenas agarrei num pedaço ou outro de comida e arranquei.
Voltei a tentar recuperar o lugar onde até ali vim, e voltava à subida, desta vez não tanto agressiva, ligeiramente mais rolante pelo largo estradão.
Até ali estava tudo a correr na perfeição, apertava bem na subida, e quando não conseguia colocava uma caminhada mais forte, e descidas eram feitas mais rápidas que o normal.
Felizmente e apesar do temporal dos últimos dias, o terreno não esteve escorregadio como pensava, mas ia com alguma cautela. A única coisa que me estava a falhar, eram as marcações, não que estivesse mal fitado, mas por não haver reforço de fitas em cruzamentos, ou desvios do caminho, tendo enganado por diversas vezes, ainda que em poucos metros, mas que obrigava a parar e procurar.


Vale Correr

Nesta altura já havíamos deixado para trás um dos elementos do grupo, ficando eu também pouco depois. Numa das decidas acabei por perder o contacto e já seguia sozinho, mas ainda que perseguido por mais 4 ou 5 elementos. Não parava, e mantive sempre corrida forte o quanto possível sem implicar um desgaste completo.
Obviamente acabaria por ser ultrapassado, a gasolina estava a entrar na reserva, e não estava a alimentar como deveria, e com aproximadamente 12 KM, fico à minha mercê vendo os restantes a distanciar-se.
Pareceu-me ter afectado aquele momento, parece que tinha quebrado, e só estava à espera de rebentar, não estava com grande motivação, mas ao mesmo tempo ainda continuava a lutar. Ainda faltava muito para terminar, e a prova disso era ainda ir apanhando alguns pelo caminho, mas sem sinal de vista do grupo em que seguia.
O segundo abastecimento era junto à capela de São Marcos, o que significava subir uma colina em terra, com rochedo cravado para dificultar a progressão.
Foi o abastecimento que demorei mais tempo de toda a prova, ainda que por uns breves 1 a 2 minutos.
Metia-se de imediato mais uma descida onde me enganei uma vez mais por não conseguir ver as fitas, e tive que avançar uma pequena vegetação para chegar ao caminho certo.
Estou mais moralizado, e volto a acelerar a passada, as subidas que vão surgindo já se fazem com mais facilidade novamente, as descidas também igualmente mais solto.


É para subir sim. Créditos na foto

Pensava que o pior já estava feito, mas ainda restava algumas subidas, e esta primeira que nos levava ao ponto mais alto da prova, começava com um suave zigue-zague. A coisa é minimizada, com um sobe e desce ligeiro ali pelo meio, como a falsa fé, até nos presentearem com mais uma subida, só que agora a direito, por entre árvores pedras, sem caminho. Não que fosse demasiado inclinada e/ou longa, mas dado massacre que levava de trás já sentia um inchaço junto aos joelhos.
Foram uns míseros 150 metros ganhos, em quase 1 quilómetro, e quando pretendia e queria descansar o quer que fosse, não dava, a descida estava logo ali, inclinada, mas pelo menos rolante, e de forma a que conseguia recuperar algum tempo perdido. Passava algum pessoal da prova de 15 KM, e isso acabaria inevitavelmente por tornar-se um objectivo. Não menosprezando ninguém, mas aquilo estava a tornar-se claramente uma motivação para mim, não ganhando nada com aquilo, mas era uma forma de me animar.


Créditos na foto

Era de facto nas descidas onde estava a conseguir encaixar-me, eram perfeitas para rolar, e conquistavam-me, um trilho bem aberto e com desvios constantes, às vezes somente em carreiros, outras já com o apoio das mãos em árvores, divertia-me, e aliviava a pressão que tinha nos músculos.
Restavam mais 3 típicas subidas e respectivas descidas, não tão longas como as outras era certo, mas inclinadas q.b. para rebentar os músculos por completo. Senti cada pontada dos músculos, e o efeito “bola” que estava a criar uns milímetros acima do joelho, sendo apenas aliviado quando deixava as pernas mais soltas quando descia ou conseguia correr normalmente.
Faltava pouco mais que 2 quilómetros para o final, e já não queria saber da constante pressão dos quadríceps, só queria correr, e o trilho das minas foram uma sobremesa tipo gourmet, deliciosa, mas pequena demais. Um trilho escondido no grande arvoredo, composto de folhas castanhas, e encostas verdes, uma delicia que deveria ser mais duradoura.
Restava apenas mais um single track paralelo ao rio para chegar à praia fluvial, e ali estava ela.

Tive que gerir a prova mais cedo do que previa, e isso levou-me à 22ª posição de uma prova com um inicio agridoce.
Foi uma primeira edição, mas penso que existe malta na organização com conhecimento necessário para perceber que é preciso mais para agarrar os atletas.
Foi provavelmente das provas em que usufrui menos do abastecimento, mas o suficiente para perceber que eram básicos demais, mesmo para uma distância de 25KM. As marcações, foram o que relatei acima, sendo boas, mas com falta de reforço em alguns pontos mais importantes. O percurso em si, está bem desenhado, mas acredito que consigam acrescentar ou alterar alguma coisa para o melhorar. Isto é apenas a minha opinião, baseada naquilo que experienciei.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Europarque Bio Run - Mete lama nisso


É o culminar de 3 provas, Trilhos Termais, Corrida Urbana, e agora o Bio Run.
Já a havia feito anteriormente, mas era prova que não me tinha conquistado, nem me chamava atenção necessária. Sendo a última das 3, com uma classificação final do conjunto, e estava minimamente bem classificado era a motivação necessária que precisava.
Estava em 9ª lugar, a uns míseros 3 pontos da 8ª posição, e também a uns poucos dos restantes, mas tinha que ambicionar apenas uma coisa, e colocar-me a um único objectivo, encontrar o 8º classificado e terminar à frente dele, só assim o ultrapassaria.


Foto da organização

O tempo era o expectável para aquela manhã, chuva e frio, e mal cheguei ao Europarque já a chuva se sentia algum tempo, o que prometia um piso escorregadio quando cruzássemos os trilhos. O percurso é de piso misto, estrada e trilhos, sendo estes últimos com menor percentagem, contudo o suficiente para abrandar quem quisesse andar, ainda para mais com as sapatilhas que levei, que nada apropriadas eram para aquilo que ia fazer.
Já o aquecimento estava feito, quando vejo os blocos de partida a serem preenchidos em massa, tinha que tentar colocar o mais à frente possível, o suficiente para evitar congestionamentos e confusões. Aguardava o tiro de partida, mas sem encontrar o 8º classificado, não o via, teria que ser durante o percurso.

Arrancamos poucos minutos depois da hora, mas com a velocidade de como estivéssemos a recuperar tempo, percorrendo uma longa recta com pouca inclinação.
O retorno já era feito em jeito de recuperação de caixa, até entrar nos primeiros trilhos. Foi logo ali, que vi o 8º classificado, a pouco mais que 100 metros de mim, e onde queria começar a controlar a distância. Os primeiros passos sobre o terreno enlameado, foram o suficiente para perceber a escolha errada no calçado, tinha que ter cuidado para não dar uma queda mais aparatosa.
Saímos rapidamente do trilho, e seguíamos pela longa calçada que percorre o parque, e de repente estava a poucos metros de distância do meu objectivo.
Pausei e abrandei um pouco o ritmo, não seria a altura ideal para atacar, nem para andar já com ritmos mais rápidos.


A voar para a segunda volta. Foto da organização

É uma prova incerta, tanto se esta a subir, como a descer, como em estrada ou em trilhos, é mesmo tudo misturado e sem folga para descanso. A subida em zigue-zague por rampas de acesso, uma descida abrupta em terra para um jardim e a subida em asfalto até ao terreno coberto de lama provavam que não poderíamos descansar, nem com tempo para recuperar o quer que seja.
O piso estava coberto com lama, e sentindo os pés a deslizar, tive que abrandar repentinamente e calcular o próximo passo.
A lama era abundante, o single track que se seguia colado ao rio, era o segmento que mais adorei, mas que era impossível de se fazer sem ver onde colocar o pé.


Junto ao rio. Foto da organização

A saída do trilho não era fácil, numa inclinação do jardim coberta de lama obrigava o uso das mãos para equilibrar e não deslizar por ali abaixo.
A típica volta ao lago era o local ideal para conseguir recuperar algum tempo, mas dado o uso forte das pernas, sentia-as duras, e limitei a manter o ritmo.
Saí de rompante pela escadaria, e seguia em direcção à ultima secção de trilho pela longa subida sobe um passeio.
A terra ali estava mais consistente, não era tão escorregadio, mas nem isso evitava de prever qual o melhor caminho.
E de repente estava na partida/meta, contava 5 quilómetros, e teria que repetir o percurso todo novamente.
Nada que eu já não soubesse à partida, mas que me aborrecia de certa forma, não fosse ter um único objectivo, e que já tinha fugido de vista algum tempo.
A passagem pelo asfalto era feita de imediato em velocidade máxima até ao retorno, local onde o revejo finalmente, e começo a tentar a aproximação.
Entrava no trilho e já o via novamente a poucos metros de distância, mas ainda era prematuro fazer alguma coisa. Apenas controlava a distância e não o deixava fugir, aproximando gradualmente.


Contornando o lago. Foto da organização

Nas rampas de acesso via que estava mesmo a poucos metros de mim, agora era gerir para logo depois poder atacar e avançar. Entrava no asfalto e a aproximação foi tanta, que pensei logo, “está feito”, apenas descolei-me um pouco quando se meteu de novo a secção com mais lama, queria seguir sem ninguém por perto, para não atrapalhar, nem a mim.
Contudo esta parte estava mais complicada, fruto da passagem de centenas de pessoas ali, o single track que ainda era minimamente acessível, estava impossível de correr sem o pé fugir. Estava prestes a terminar aquele terreno mais enlameado, restava subir até ao lago pela mesma subida que me obrigou a usar as mãos na primeira volta.
Agora não foi excepção, mas nem isso me valeu. Assim que estou quase a chegar ao cimo, começo a sentir os pés a fugir, e só paro na base da subida.
Foi o suficiente para perder posições e o contacto com o 8º classificado, as pernas ficaram duras do esforço que fiz para subir aquilo, não conseguia colocar novamente o ritmo que queria. Quando iniciava a última grande subida, já o via a uma longa distância, a entrar no último segmento de trilhos.

Tentei ainda o último quilómetro a ver se conseguia aproximar, mas não deu. Aquele deslize foi o quanto bastou para perder aquela que provavelmente, em circunstancias normais, seria uma vitória para mim.
Apesar de tudo considero ter feito uma boa prova, tendo perdido pelo terreno estar coberto de lama, e consequentemente a má escolha do calçado.

Tendo faltado no ano anterior, penso já ter havido algumas melhorias por parte da organização, contudo, não considero ser o meu tipo de provas de eleição, não sendo uma prova de estrada, nem de trilhos.

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Maratona do Porto - Uma vitória sofrida

E vão cinco. Foi a quinta maratona, e terceira participação na Maratona do Porto.
Já conheço o percurso da frente para trás, e de trás para a frente, o que só de o antever, já cansa a mente. Tem vários segmentos, que são fantásticos, outros menos interessantes, enfim, tem de tudo.
Queria fazer udo de forma diferente desta vez, e a começar por chegar a tempo e horas, e assim o fiz. Reunimos a comitiva para esta empreitada, e rumamos a Matosinhos, para mais uma participação.
Não fizemos a coisa por menos, e chegamos cedo, e com tempo que sobre para tudo e mais alguma coisa, acabando por conseguir colocar mesmo no inicio do bloco A, tendo pela frente apenas a elite e sub-elite.
A minutos da partida, cortavam-se as divisões dos blocos, e colocava-me a escassos metros da partida, mesmo atrás da elite, e a adrenalina começa a surgir.


Foto da organização

O inicio é sempre de arrepiar, e deixei-me embalar por tudo em redor, e deixei-me ir na onda de todos que me rodeavam e corriam ferozmente logo de inicio.
Não durou muito para se dar o clique, e cair na realidade, que aquilo eram 42 quilómetros, e não meia dúzia, e abrando o ritmo.
Ia seguir a “receita” da Maratona da Europa, que resultou na perfeição. Manter um ritmo certo, e controlar pelo relógio. Sabia que tinha os balões das horas, mas não gosto da confusão em volta, que pode ser um problema em alguns casos durante o decorrer da prova. Para ajudar a minha decisão, foi o ritmo louco que o responsável por aquele tempo estava a fazer, com previsão para terminar abaixo das 3 horas em cerca de 10 minutos, e aquilo certamente não era para mim.

Deixei-me ficar para trás, a minha passada no meu ritmo e sem atropelos. Mesmo assim as coisas não seguiram o plano à risca, não que tivesse uma faca encostada às costas para correr mais depressa do que o que devia, mas por ter o sangue a ferver e ver aquele grupo a afastar-se, acabava por apertar mais um pouco, e elevava o ritmo para um patamar inapropriado.
Não descolava o olhar nem deixava o grupo distanciar-se em demasia, tentava controlar aquilo tudo enquanto corria, e me surgia os primeiros problemas ainda em direcção aos primeiros 10 quilómetros.
Havia arrancado com vontade de verter líquidos, que pensava que com o decorrer da prova se afastaria, e como quando surge um problema não vem sozinho, também surgiram imensas cólicas, e assim não ia dar para estar bem e correr bem.


Foto da organização

Assim que tivesse vontade de largar aquele ar todo, não ia olhar para trás, e teria que o deixar, mas isso não acontecia. É complicado correr 42 quilómetros com uma indisposição na barriga.
Poucos momentos houve em que não sentia aquele incomodo, felizmente foi sempre quando passava pelas zonas mais movimentadas e mais emblemáticas do percurso, e a rotunda da anémona este ano estava fantástica. Já levava 12 quilómetros quando passamos pelo castelo do queijo, e deixávamos Matosinhos para trás, seguindo pela longa recta da marginal, um pouco mais deserta de apoiantes, mas sempre bonita de apreciar.
Ali ainda se vai fresco, e não custa fazer a travessia com cabeça erguida e olhar para o fim daquela longa estrada.




Já estava em direcção à Ribeira, com cerca de 17 quilómetros, e já vinha alguns a olhar para um sitio para encostar e verter águas, tinha que ser, e ver se conseguia acalmar aquela indisposição.
Não demorei muito, e voltei, acelerei um pouco para retomar onde estava, e continuava a sentir em perfeitas condições. Dava-me a sensação de haver mais gente, mais aplausos e mais entusiastas daquele que é um desporto em ascensão já há vários anos, e os espanhóis e franceses juntavam-se à festa, parecia haver um em cada canto, foram fantásticos.
A zona da ribeira é sempre o ponto alto desta prova, e a travessia da ponte Dom Luís é a cereja no topo do bolo. O aglomerado de gente ali, é qualquer coisa, só não podiam correr por mim. Chegava aos 21 quilómetros com 1:30h, estava bem folgado, e contente por ter aguentado tanto com toda aquela confusão na barriga.
A zona de Gaia, é manhosa, alguns altos e baixos e paralelos à mistura, trituram de forma lenta e impiedosa, e eu não fui excepção.
Foi ali que comecei a acusar tudo e mais alguma coisa, estava incomodado com aquele desarranjo, e com inicio de caibras na coxa direita, e não queria parar para evitar quebras de ritmo.


Há que dar ânimo. Passagem na Ribeira

Abrandei, e forçava a passada, implorava para passar rapidamente os paralelos, e não desgastar na subida para o tabuleiro da ponte, mas sabia que era questão de pouco tempo para rebentar e ter que caminhar, iria inevitavelmente bater no muro desta vez.
Não me importava, o que me importava era terminar, era atravessar a meta seja de que maneira fosse.
Atravessava a ponte novamente, e rumava em direcção à ponte do Freixo pela marginal, mas nem a vista sobre o rio, ou aquela gente me conseguia dar incentivo para forçar, estava derrotado.
O abastecimento dos 30 KM estava, ali, a poucos metros de mim, quando tenho a primeira quebra, não me envergonhava estar a caminhar, nem me envergonho de o admitir, mas não conseguia correr mais.
Não pus de parte a desistência, mas interrogava-me se não conseguia terminar na mesma, nem que seja a ritmos mais lentos. Ia intercalando alguma caminhada com corrida, mas seria capaz de o fazer? Ia tentar.


Passagem pela ponte D. Luís I. Foto da organização

Punha a cabeça em ordem, enquanto ia tentando um trote aqui e ali a ver se a máquina já queria funcionar. Só consegui correr algumas centenas de metros, até entrar no túnel e ouvir “Chariots of Fire”, dos momentos mais especiais desta prova, dá para arrepiar.
Estava revoltado, queria correr, mas o corpo não deixava, não era psicológico era mesmo falta de treino e capacidade para estar ali naquele dia, treinasses.
Foram várias centenas de metros feitos a caminhar, alguns intercalados com uma espécie de corrida, mas era o melhor que conseguia.
Por momentos senti-me com energia, e ainda consegui alguns minutos com ritmo confortável de corrida, e assim me mantive até quebrar de novo na longa recta interminável da Av.ª do Brasil.


Tunel e "Chariots of Fire"

O apoio ali deixou de ser feito somente de fora, mas também de todos os que ainda participavam, e mesmo em esforço não deixavam de dar o apoio, e contribuíam para os últimos quilómetros. Também deixou de ser para os atletas em geral, mas sim individualmente para cada um de nós. Sentia que estava feita, não sabia como, mas sabia que ia terminar, sofri, passou-me de tudo pela cabeça, mas consegui, estava frustrado, mas contente, só queria ver alguma cara familiar.
Chegava à rotunda do castelo do Queijo, e ali uns poucos metros tive que abrandar de novo e abanava a cabeça, como se não conseguisse mais, não fosse eu acordado de seguida. Não lhe consegui agradecer devidamente, mas puxou por mim, alguém, que caminhava em sentido contrário ao meu. Reparou que estava derrotado, e ali berrou por mim, não sei como o fez, mas deu-me alento, deu-me a coragem e a força que necessitava para o final, já feito sem pernas, mas com cabeça e coração, apenas com vontade de atravessar a meta. OBRIGADO!


Inicio da Avª. do Brasil

Longa, a recta, e as pessoas começam a aparecer, os últimos aplausos, e a última subida para a meta, aquela subida da rotunda da anémona para o queimódromo onde as pernas começam a querer quebrar novamente, mas agora não, corria com a cabeça e lutava para continuar, enquanto a minha família ali estava a apoiar e gritam por mim. Levanto a mão e tento não deitar uma lágrima, viro para o recinto e só mais uns metros e atravesso o pórtico. Estava feito.
Não da maneira que devia, mas da forma que consegui, sofrida e arrebatadora.
Encostei-me a uma das grades, e debrucei-me a acalmar a respiração e a esticar um pouco as pernas, enquanto pensava em tudo o que havia passado naqueles 42 quilómetros loucos.
Desde o arranque frenético, ao acalmar os cavalos e controlar o ritmo, as cólicas e inícios de caibras, a corrida e a caminhada, a imensidão de gente em vários pontos, e ruas despidas, o apoio mais individual que já experienciei, e a admiração pelos apoiantes de Espanha e França, que contribuíram em grande para que as partes mais monótonas fossem vividas de outra forma, o saber correr já não com as pernas, mas sim com a cabeça, e o ver a família ao fim daquela conquista.


A chegada sofrida. Foto da família

Foi sofrida, dolorosa, mas vivida e conquistada.

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Freita Skyrunning - Um dia não


Nem sempre a coisa corre como queremos, e aí, resta-nos pensar no que correu mal, no que poderia ter corrido melhor, levantar a cabeça e seguir em frente.
A Vadia Mini Skyrace, foi o regresso aos trilhos após uma longa paragem, também um pouco feita de forma a ver como estava, e digamos que um treino para a Freita Skyrunning, essa sim, seria a prova que queria deixar, dar, e entregar tudo de mim, não para resultado pessoal, mas sim pela equipa Vale Correr. Queria assegurar que era um dos que contribuía, ou tentaria contribuir para chegar ao pódio de equipas, se possível ao 1º lugar.


Foto da organização

E foi nesse pensamento que me desloquei para a Felgueira, aldeia de Vale de Cambra, mesmo na base da Serra da Freita.
A partida, feita num local diferente das 2 primeiras edições, deu-nos a possibilidade de percorrer um pouco por entre a aldeia, mas que rapidamente nos levaria para o habitual percurso desta prova. Os primeiros quilómetros eram um excelente aquecimento, bastante espaço para correr, e caminhos completamente limpos, por um longo estradão deixando a serra para trás. Somente aquando o inicio da descida, é que somos despertados para um maior controle da nossa corrida, de onde poderíamos ou não colocar o pé, nada de muito agreste, mas o suficiente para ter mais atenção.
Foram cerca de 2 quilómetros a descer sem grandes problemas, pelo menos até chegar a Cabrum, onde nos fariam voltar à Felgueira.

O retorno, realizado por caminhos diferentes ao inicialmente feito, eram mais diversificados e mais bonitos, mas como era lógico tinha que ser a subir, transpondo pontes, escadas, um pequeno rio, e alguns muros em pedra já tombados.
Adorava poder dizer que me diverti ali, mas infelizmente foi uma pequena tortura. O joelho manifestou-se durante uns metros, e impedia que conseguisse correr normalmente sem dores. Ia com cerca de 5 quilómetros, e a ideia de ter que abandonar a prova já pairava na cabeça.
- “Estaria a piorar a situação?” – “Iria parar logo agora que estava a começar a diversão?”
Abrandei o passo, e ao mesmo tempo a dor atenuou, sentia melhor, pelo menos do joelho, mas surgia um outro problema, estava ofegante e sentia cansaço físico e as pernas estavam pesadas.
Comento isso com o João Paulo que estava a ver-nos passar mesmo na aldeia da Felgueira, indicando que vou bem, ia em 11º, para abrandar e descansar um pouco naquele que era o segmento mais corrivel de todo o percurso.


Foto da organização

Estava quase com 7 quilómetros já percorridos, e estava cariz baixo, não estava a dar, não conseguia correr uns 100 metros sem ficar ofegante e cansado.
Calma, pensei. Caminha um pouco, respira fundo e deixa o corpo refrescar. Aos poucos ia tentando um trote, até sentir a respiração mais controlada, e as pernas a responder, vamos lá, agora sim.
Um longo estradão, deu-me ousio para puxar um pouco mais, talvez em busca de recuperar algum tempo perdido atrás. Voltava a ter o andamento enquanto ia ultrapassando alguns atletas, até recuperar a posição perdida.
Regressava a Cabrum, onde tive uma curta paragem no abastecimento. Comi e enchi as flasks, e voltava à corrida.
Finalmente estava a sentir-me bem, conseguia puxar sem grandes problemas, não estava com quebras, nem com faltas de energia, comecei a deduzir que o fraco aquecimento que fiz tivesse tido algum impacto, mas teria que continuar a gerir para a grande subida da prova.


Chegada a Cabrum. Foto da organização

A gestão foi feita logo que chego à levada, onde tinha que ter cautela, caso contrário, seria um tombo monumental, mesmo assim estava a seguir minimamente rápido.
Chegava à longínqua aldeia de Paraduça, que indicava a 3 coisas – a primeira, era que todo o esforço até ali feito, se não fosse bem gerido iria sofrer – a segunda, era a proximidade de uma subida curta, mas inclinadíssima que era um pré-aquecimento para a subida, que nos leva ao terceiro ponto, a grande subida. 4 quilómetros que nos acrescentava cerca de 800 metros de desnível, sem dó nem piedade.
Mas uma coisa de cada vez, primeiro abrandava um pouco a passada enquanto atravessava a aldeia, até entrar no longo caminho que nos levava até ao fundo da Freita, às entranhas daquela serra.
Sem antes ter de enfrentar aquele pinhal, curto, mas inclinado ganhando 100 metros de desnível em pouco mais que 400 metros de distância.
Não saí dali com pernas nas perfeitas condições, mas ainda com capacidade, capazes de continuar. Não desatei a correr, faltava uma louca descida. Aquela que sempre me fez confusão, e sempre irá fazer, visto ter uma inclinação entre os 30 e 40%, uma autêntica parede.

Estava no fundo, nas Berlengas, cheia de caminhos e pequenas casas em pedra abandonadas, onde já passei por diversas vezes, sabia o que ia enfrentar, e o que poderia e como deveria fazer para subir, tinha tudo estudado na cabeça, mas nada nem ninguém antevia aquilo…


Créditos na foto. - Desde lá do fundo...

Até lá cima. Créditos na foto

- “Vamos por partes, com calma e sem grandes lamúrias ou excentricidades” – pensei.
Juntava-me a mais dois atletas, seguíamos em comboio na típica escadaria em pedra irregular que compõe aquele local.  O silencio apenas é interrompido com a respiração, e com cada passada que damos, enquanto atravessamos as inóspitas casas. Há um pequeno brinde, uma pequena descida que nos leva até à travessia do rio, a partir dali não há brindes, não há surpresas agradáveis, nada. Apenas escalar e subir, trepar até ao ponto mais alto.
São cerca de 200 metros, mais coisa menos coisa, onde a única função que é possível de fazer é trepar. Não ter alguma base de apoio sólida onde colocar a mão para ajudar a progressão é um sacrifício para as coxas, toda e qualquer rocha, ou árvore, que possa colocar a mão é sem dúvida a única coisa agradável que aquele local tem. Esteve sempre uma manhã fresca, com o sol por vezes a espreitar, mas sem ser forte o suficiente para incomodar. Não que ele conseguisse atingir ali naquela “fundega”, mas o ar, esse elemento era insuportável.

Antes uns dias ia vendo o tempo para sábado, sempre a pedir que não chovesse, mas naquele momento rezava por uma pequena brisa fresca. Parecia que tinha entrado numa sauna, ar pesado e um calor imenso, dificultava a respiração e aos poucos a progressão, sentia-me acabado e sem energias.
Perguntava a quem vinha atrás se queria passar, quando me respondem que não, que vão bem naquele ritmo. Mas eu não, não ali, não naquele dia, era um dia não.
Logo que termina toda aquela tortura, entramos na crista daquele vale, seguindo por um caminho não tanto inclinado como o anterior, mas inclinado, não tão técnico como o anterior, mas técnico dadas as circunstâncias.
Aquele inicio de subida, não só me derreteu as pernas, como a cabeça, fiquei sem reacção, sem pensamentos, vazio. Estava derrotado.
Até que se deu o clique, alguma coisa estava mal e tinha que perceber o que era rapidamente, reparava que tinha transpirado em abundância, tinha a roupa colada ao corpo, e a reserva de água estava mesmo a terminar, e o abastecimento que havia na divisão da subida, ainda faltava.

Vou mandar um gel abaixo, esse pensamento bastou para perceber que nem o meu estomago estava para aí virado, substituo então por uma barra, que assim que a dou uma trinca deu para perceber o estado em que me encontrava, a desidratar. O grupo que ia a liderar naquela subida acabaria por seguir, enquanto eu ficava para trás, sem força sem nada. Teria então o pensamento mais correcto para o meu bem-estar, no abastecimento terminava, ali ficaria, e desistia.
Continuar naquele estado iria ser um sofrimento total, e não estava disposto a isso.
Assim o fiz, logo que chego ao abastecimento, falo com quem ali está, e digo que ali fico, enquanto me tenta convencer do contrário.
Mantenho a palavra, até ele perceber que estou mesmo decidido. Restava beber água, comer, e continuar a beber água, enquanto vejo imensas pessoas a prosseguir caminho. Acho que em circunstâncias normais, teria chegado ao final em boa posição, mas isso fica apenas na minha ideia e nunca saberei se o conseguiria. A prova tinha terminado para mim, parei o relógio, e cumprimentava a malta que me vinha perguntar o porquê de ali estar.
A malta da equipa ia chegando, e vinham ter comigo, viam que estava bem, e continuavam para lutar pelos objectivos, tanto de escalão, como de posição feminina.
Até aparecer o Paulo e Roni, chegaram e vieram ter comigo, naquela altura já me sentia melhor, já tinha hidratado e comido, estava claramente renovado. Insistiram comigo para continuar com eles, que iam devagar, também não havia outro método dado a continuação da subida, e acabei por ceder.


A derrota espalhada na minha cara. Foto da organização

A prova já tinha terminado para mim, por companheirismo e por desportivismo acabei por continuar e desfrutar dos trilhos de forma diferente, da forma que desfrutava quando me iniciei nisto.
Inicialmente ainda me fez confusão aquela subida, e deu-me a sensação que não estava preparado, o facto de ter estado sentado, travou-me as pernas, e só após alguns metros, consegui com que estivesse mais solto. Em caminhada lá fui progredindo rumo ao topo, mesmo no alto de uma crista bem saliente.
A passagem nas escarpas, significava o fim da fase mais complicada, dali para a frente, tudo melhorava, a começar pelo abastecimento numa zona mais plana, e só depois subir um pouco mais até à torre meteorológica.
Foi ali, no abastecimento que o Paulo seguiu e fiquei com o Roni, ele que agora acusava caibras, e que não estava a conseguir correr minimamente sem sentir um pouco de dor, fiquei para trás, agora eu a puxar por ele, até ao final.


Radar meteorológico. Foto da organização

Logo após a torre, e por distracção, seguimos o trilho errado, e 200 metros depois, tivemos que voltar para trás. Descemos então até à aldeia da Castanheira, que nos levava à descida para a meta. Num pequeno carreiro, sob várias pedras prosseguimos até à aldeia da Felgueira.
Foi de facto um dia não, apesar de ter terminado, não foi da forma que queria, ou da forma que pretendia fazer, não consegui contribuir para o troféu da equipa, mas que os restantes atletas se esforçaram para o ganhar, numa prova que continua fiel a si mesma, bestial.

Vale Correr em grande


terça-feira, 8 de outubro de 2019

Vadia Skyrace - Uma vadiagem

Um regresso após dois meses de maus e poucos treinos, é sempre estranho.
Pensar que ainda conseguimos fazer aquilo que fazíamos tão bem, até à bem pouco tempo, e quando caímos na realidade tudo se modifica.
De facto, foi isso mesmo que me aconteceu, meia dúzia de treinos, foram os suficientes para tornar de forma clara que a inscrição nos 23 KM da Vadia Skyrace, seria um tiro ao lado, e uma valente tortura para mim. Uma pequena lesão junto à data, foi o suficiente para conversar com a organização para alterar a distância, para os 15KM, e aí sim poderia ter alguma chance de fazer alguma coisa em condições.

Foto da organização

Parece que já não sabia como era ir para uma prova, o longo tempo sem estar atrás da linha da partida, fez esquecer qual era a sensação. Na verdade, 2 meses não é muito tempo, mas pareceu uma eternidade.
A lesão que tinha contraído, não dava sinais de vida, mas não queria ter recaídas, daí ter optado por aquecer bem antes do tiro de partida, e chegar a tempo de me posicionar bem para o tiro de partida.
A prova percorria muitos trilhos por onde treino, na serra de Lordelo, que não sendo propriamente bonita ou com paisagens de encher o olho, consegue ter caminhos duros e implacáveis. Não tem muita altitude, mas quando se mete uma subida e/ou descida, é vertiginosa.

Em Ossela, colada a uma das encostas da serra, dava-se os primeiros passos de corrida. Foram 1000 metros, de extensão a descer até deixar a estrada para trás. Conhecia perfeitamente aqueles trilhos e o que iríamos fazer em grande maioria, e sabendo que não tinha grandes treinos, e saído de uma lesão no joelho não poderia abusar logo ali como o faria em circunstâncias normais.
Ainda assim, queria evitar a confusão em trilhos, daí ter forçado mais quando entramos numa levada e depois então em campos, paralelamente ao rio Caima.

Seguia-se uma das zonas que mais me faz confusão atravessar, devido à irregularidade do terreno.
Mesmo junto ao rio, pedras aguçadas e escorregadias misturadas entre si, eram um martírio e preocupação, nem mesmo a minha cautela e paciência evitaram de uma possível lesão bem grave ali, quando o meu pé escorrega por entre uma das pedras. Felizmente foi só um susto. Foi um quilómetro de inúmeras oportunidades de quedas, até finalmente atravessar o rio. E aí sim, ia começar a prova, no que a subidas e descidas diz respeito.
Foram somente 100 metros de desnível, mas com inclinações por vezes superiores a 30%, havia perdido algum tempo junto ao rio, mas não era ali que também o ia recuperar, seguia a caminhar da melhor forma que conseguia e com maior rapidez que podia, a tentar apanhar o atleta da frente. Atrás não via, nem ouvia ninguém, não me preocupava, apenas em conseguir não distanciar do da frente, e tentar então o apanhar.

Conhecia perfeitamente a zona e sabia que as verdadeiras subidas estavam ali perto, prestes a começar. Bastou atravessar um pequeno túnel, e ali estava a serra de Lordelo. Teríamos que subir até um dos cumes, onde ganharíamos 200 metros de desnível, em 1 KM de distância.
O terreno era o típico daquela serra, pedra solta em tudo quanto é lado, raízes das árvores, terreno incerto e escorregadio.
Foi ali com cerca de 6 quilómetros, que começo a passar os últimos dos 25 KM, que eram acompanhados pela Sãozita que fazia de vassoura, e me indicava que estava entre os 10 primeiros. Estava com um ritmo certo, sem grandes abusos, mas achei estranho estar tão bem classificado, no entanto aquele seria o ritmo até algo em contrário.
Fiz a restante subida a pensar nisso, e que se mantivesse aquela posição poderia ter pelo menos hipótese de conquistar o troféu de equipa, já que o Fábio e João Paulo já estavam bem na frente.

A ver vamos, pensei. Não dava para descansar, atingindo o topo, metia-se imediatamente uma descida, que conseguem ser tão ou mais massacrantes. Pode-se descrever como um escorrega, a terra é solta, com pedras cravadas ao solo, da melhor forma desci, mas sem querer atingir o joelho, o que inconscientemente me fazia travar e causar mais impacto, foi ali que perdi o contacto com o atleta que me precedia, mas que recuperava assim que entrava na subida das subidas, a “Subida da Vadia”.
São sensivelmente 500 a 600 metros de distância, onde adicionamos quase 200 metros de desnível, com a maioria de percentagem de inclinação a rondar os 30 a 40 %.
Aquela zona, é de rebentar, pernas e pulmões, até chegar ao ponto mais alto da serra, realçando os quadríceps e gémeos. Completamente exposta ao sol e com o fim à vista, perfeita para nos rebentar fisicamente, e triturar psicologicamente.

Mesmo no cume. Foto da organização

Todo aquele esforço parecia em vão assim que conquistava algo, uns 20 metros de corrida no topo e já estávamos a descer. A melhor vista que se tem durante todo o percurso não é possível de ser captada, não para mim que estava a tentar conquistar um troféu para a equipa.
Logo após a pior subida do percurso, mete-se a pior descida, no já típico terreno, mas ainda mais irregular.
Estava com 8 quilómetros, quando chegamos a Lordelo, freguesia de Vale de Cambra, cravada mesmo na encosta da serra, e onde havia o posto de abastecimento. Parei por uns minutos, suficientes para ser ultrapassado novamente pelo atleta que acabava de deixar para trás.
Safava-me nas subidas, somente ali era onde estava a ver melhores resultados comparando com os restantes.
Foi a subida mais acessível, não deixando de ser técnica o suficiente para derreter pernas, mas talvez devido ao reforço estivesse mais fresco naquele momento, conseguindo recuperar novamente o lugar que havia conquistado há pouco.

O trajecto era regular, “sobe” – “não se descansa” – “desce” – “não se descansa”, e assim sucessivamente. A descida da trialeira, e a subida do trilho do castor, faziam jus ao que ali se passava e naquilo que a prova realmente era, um sobe e desce repentino e constante, sem que as subidas ou descidas sejam muito prolongadas, mas sempre bastante inclinadas.
A travessia da serra de Lordelo estava feita, agora havia um pequeno monte, uma pequena serra, que era separada da anterior apenas por uma estrada, denominada pela Sra. da Graça, ou miradouro das sete cidades.
Era mais uma daquelas subidas agrestes, curtas, mas inclinadas e de triturar pernas.
Restava poucas forças, e só com alguma ajuda é que conseguia manter o ritmo, um gel, lembrei-me.
Não foi o que me salvou, de todo, talvez tenha dado alguma energia, mas não a que queria, não fosse a indisposição que me causou enquanto o mando abaixo.

Foto organização

Ultrapasso mais um atleta, enquanto sou ultrapassado, por um outro. Não queria saber, era fundamental para mim não entrar em exageros naquela fase, sabia que ainda tinha que voltar para trás, apesar dos 4 a 5 KM finais serem mais acessíveis.
Foi dura de roer, mas consegui assim que atingi o topo comecei a correr ainda que a trote, por um dos caminhos da “Descida dos 4 caminhos”.
Não havia hipóteses, não havia descanso, e já imaginava o que se seguia, mais uma curta e inclinadíssima escalada, e ali estava ela.
Por momentos ainda focava no atleta da frente para recuperar aquele lugar, mas aos poucos acabei por o perder de vista, ele lá seguiu e eu ali ia ficando, agarrado às pernas e a tentar recuperar alguma caixa.

Atingir o cume era a maior vitória, só não sabia que descida me esperava.
Não é nada demais, assim o pensei logo que a transponho, alguma pedra solta, mas nada comparado com a lavagem que até ali levei nas pernas.
Esse seria mesmo o problema, o massacre que já levava em cada um daqueles troncos que me sustentavam foram o suficiente para não conseguir descer como queria, o joelho manifestava-se a cada passada que dava, passando para uma corrida mais defensiva, abrandando para não estragar mais. Acabava por ser uma vez mais ultrapassado, enquanto pedia subidas, que já não apareciam, ou pelo menos um piso mole e rolante.

De alguma forma o pedido foi atendido logo após entrar num trilho junto ao rio, onde se podia correr, ali sentia confortável, e sem sacrifícios. Pelo menos até ver que teríamos que transpor um pequeno riacho, envolvido em pedras. Não houve descanso durante todo o caminho, não ia ser ali que o iríamos ter. O joelho preocupava-me, e só calculando cada passo seria a melhor chance de não estragar tudo a tão pouco do fim.
Aqueles dois lugares ganhos, tinham sido perdidos, mas iria lutar até ao final para não perder mais nenhum. Faltava pouco, 1 quilómetro, indicava uma das placas da organização, e quando aumentei repentinamente o ritmo até à Vadia, local da meta.

Ainda tive boa cara para terminar. Foto da organização

Deu para chegar em 9º lugar, e arrecadar o 1º lugar de equipas, em conjunto com outros dois amigos que haviam chegado à frente. A prova, como o tanto frisei, não deu descanso, foi sem dó nem piedade que nos foi triturando fisicamente, numa serra que de bonita não tem nada, mas que consegue ser severa. A organização encarregou-se de mostrar isso mesmo, o que se pode fazer de bem com tão pouco.

Pódio composto por equipas de Vale de Cambra. Foto da organização


Vale Correr em força.

quinta-feira, 18 de julho de 2019

ViverArões - Um pleno


Não há nada como correr em casa.
Com o crescimento do trail, e a organização de inúmeras provas durante o fim-de-semana, dá para todos os gostos e feitios. Desta vez optei por um mais “caseiro”, uma prova, que até aqui era mais um “free trail”, sem qualquer tipo de competição, incorporado nas festas da terra, mas que agora optaram por cronometrar, e dar algum crédito a quem o quisesse.
A equipa Vale Correr, foi formada à relativamente pouco tempo, na qual eu também estou incluído, e quisemos lá estar, no trail ViverArões 2019, e queríamos esse crédito.
A ideia era simples, não sendo uma prova que abrangesse um leque muito grande de atletas, muito menos de elite, iríamos tentar dar o nosso melhor para ver se conseguíamos um pleno no pódio, afinal tínhamos grandes hipóteses para isso.

De facto o leque era mesmo muito pequeno, éramos 30 no total, atrás de um improvisado pórtico aguardando pelo sinal de partida.
Estava mesmo na frente junto à restante equipa, o Fábio, João Rodrigues, Marcos e Paulo, aguardando o tiro de partida. Como era tudo feito sem grandes cerimónias, também o arranque foi diferente, em coro, fizemos nós a contagem decrescente.
Saí na frente, eu e o Fábio, seguidos por um outro rapaz e o João Rodrigues.
Dali à subida que terminava ao fim de 5 quilómetros, ia na conversa com o Fábio, combinando o objectivo e como o poderíamos o fazer. Sabíamos que à partida ele ganhava a prova com facilidade, mas que iria connosco durante o percurso, salvo se alguém ultrapassa-se ele seguia atrás para tentar conseguir o primeiro lugar.
Mal inicia a subida ainda em estrada, eu e o Fábio isolamos, sendo pouco depois alcançados pelo outro rapaz que se aventurava a trepar continuamente aquela encosta que nos ia distanciando de Arões.

Pórtico improvisado. Créditos: Organização

O Fábio seguia aquilo que tinha dito, seguiu o rapaz, acabando por o ultrapassar e continuou rumo ao topo.
Eu por outro lado, deixei-me ficar, ainda ia tentando aquecer, o recente arranque sem nenhum aquecimento, a juntar uma subida bem inclinada, causara um descontrole na respiração, sem sinais de melhoria. Somente quando comecei a estabilizar, voltava a aproximar, e acompanhar o Fábio a poucos metros atrás.
Uma pequena distracção originou a uns 200 metros a mais, juntando o João Rodrigues ao grupo, formando um quarteto.
Rapidamente nos dividimos, ficando para trás com o João, enquanto o rapaz segue incansavelmente o Fábio, pelo menos até ao quilómetro 2,5, quando voltamos a aproximar e a ultrapassar.
A subida mantinha-se, dali até aos 840 metros de altura, após cerca 350 metros de declive positivo. 

A aguardar o tiro de partida. Créditos: Organização


Seguia-se uma descida, toda empedrada até à aldeia da Felgueira, o nevoeiro estava mais acentuado, arrefecendo um pouco o corpo que já esquentava com a recente subida. Eu e o João, acabávamos por ficar sozinhos, num ritmo mais abusivo sempre a descer ora em estradão, ora por trilhos mais empedrados.
Conhecia aqueles caminhos, por já os ter feito no Freita Skyrunning, embora em sentido contrário, daí o abuso na velocidade, e da falta de atenção às fitas, que mesmo assim as achava muito distanciadas dando a sensação por vezes de estarmos perdidos. Prova disso foi termos encontrado o Fábio pouco depois fora do trajecto, que acabava por se juntar a nós.
Seguíamos os 3 na conversa, e num ritmo mais descontraído, por uma levada que nos levaria aos trilhos mais engraçados da prova, junto ao rio, entre velhos moinhos sempre envolta de uma floresta cerrada e verde.
A longa descida, com cerca de 4 quilómetros, terminava assim que chegávamos à aldeia de Cabrum, onde se metia uma ligeira subida, por entre as casas, campos e levadas, até ao abastecimento. Num pequeno descampado, onde o sol já brilhava, estava um dos reforços que mais adoro. Tudo caseiro, e com as iguarias daquelas aldeias que dão gosto de saborear.
Não ficamos muito tempo, mas ainda fiz questão de aproveitar aqueles breves minutos para ingerir o mais que conseguisse.

Créditos: Organização
Seguia-se novamente a descida, por entre casas, mas uma vez mais, estava confuso, em adivinhar o caminho por falta de fitas.
O cenário mantinha-se, assim que percorríamos um estradão, tenho que parar para procurar as fitas, sendo que às vezes tinha que seguir um pouco às cegas, até então ver a próxima fita.
Eram vários metros até encontrar a próxima fita, e estando assim tão espaçadas, acabamos por fazer uns 500 metros a mais à procura de uma fita que não existia. Estávamos novamente perdidos. Automaticamente abrandamos, e voltamos para trás à procura da última fita. Mais 500 metros, e ali estava ela, mas sem sinal de outra que desse para continuar o caminho.

Créditos: Organização
Enquanto a procurávamos, e numa descida um pouco escondida vemos que seria por lá que deveríamos seguir caminho, surge de novo o rapaz, que acaba por ver que nos tínhamos perdido e aproveita para tentar se distanciar de nós.
Naquele momento sentia-me injustiçado, e com vontade de deitar a toalha ao chão. A única coisa que valia ali era o trilho que nos levava até ao rio, feito à mão tricotando até ao leito do rio, uma vez mais com falta de fitas, lá acabamos por encontrar o caminho, que nos levaria para a última subida. O Fábio voltava a cerrar os dentes, e seguiu, desta vez a todo gás para terminar aquilo, eu e o João, que se tinha aleijado ficamos um pouco para trás, enquanto o rapaz tentava novamente fugir de nós. Controlamos a subida, não sabíamos se era extensa, nem se iria ter muita inclinação ou não, mas teríamos que a controlar, e só dessa forma conseguimos aproximar e ultrapassar de novo.
Assim que o fizemos, não demos mais hipóteses, foi prego a fundo em rumo à meta.
Íamos frustrados, e novamente com dificuldades em encontrar fitas, e por pouco não houve mais um engano aquando a chegada de um portão fechado seguido de um muro com cerca de 1,50 metros de altura, não fosse o João a reparar nas fitas. Não tentamos abrir o portão, avançamos o muro e desatamos a correr, os trilhos eram bonitos, single tracks, misturados com caminhos antigos, e alguns riachos, mas aquela sinalização estava a deitar tudo a perder.


Créditos: Organização
Foi assim até Arões, onde finalmente cruzamos a meta, e surpreendentemente em primeiro lugar eu e o João. O Fábio chegou logo depois, tendo uma vez mais se enganado, mas agora no muro, não tendo visto as fitas e seguido em frente.
Reconhecemos que havia falta de sinalização, e indicamos isso mesmo à organização, sendo injusto para o Fábio, acabando por ceder o lugar a ele.

A opinião foi unanime, percurso espectacular, abastecimento impecável, mas falta de sinalização, ou mais reforço nos cruzamentos ou mudanças repentinas de direcção, que valeu a muitos enganos durante o caminho. Contudo, nem tudo foi mau, e o objectivo de preencher o pódio com as três primeiras posições tinha sido conseguido.

Um pódio, em pleno. Créditos: Organização